quarta-feira, agosto 24

Sentimento do Mundo


Sim, eu me emocionei. Eu me emocionei além do saudosismo francês a Charles De Gaulle. Além do saudosismo inglês a Churchill. Eu me emocionei porque eu desejei que eu não assistisse sozinha naquela sala, no Musée de l'Armée, uma obra enternecedora sobre os espólios da última grande guerra. Eu me emocionei porque, para além do conflito, naquela imensidão de mensagens políticas e sentimento do mundo, eu queria ver aquela sala cheia de gente interessada, como se fossem as aulas que presenciei, como se fosse o auditório 03 do prédio 43 em 2008, 2009, 2010, 2011, como se fosse o auditório do IEC em 2009, como se fosse o auditório do Instituto São Tomás de Aquino em 2010 e 2011 - benditas barreiras do tempo e do espaço. Porque, afinal, eu poderia ver alguns dos seus olhares e eu queria saber se vocês estariam sentindo e se empolgando e se emocionando como ou melhor que eu naquele momento. Mas isto não é uma ode à história dos outros, isto é um convite para o nosso país. Um convite meio idealizante e inteiramente pretensioso. Mas, em vossos esforços credito e acredito para escrever, espelhado na história, o futuro. - I know not what tomorrow will bring but I have a dream...

Este é o fim de Ruby in the Sky with Diamonds.

domingo, julho 10

Seu ser


Estava a perceber uma árvore cujo nome e espécie fogem da minha capacidade de percepção, mas que seus galhos eram altamente contorcidos em si mesmos quando pensei que se tivesse sido criada pelo homem comum seus galhos seriam indubitavelmente retos e previsíveis. Em meados de inverno, porém, algumas flores amarelas desabrochavam por entre as poucas folhas em um galho à reboque e bastante fragilizado, fazendo o serpentear perante a ventania. E foi quando, escondido por entre os galhos da árvore que, na minha perspectiva à frente se apresentava, eu novamente me acertei. De que, se aquela árvore fosse efetivamente plantada e preservada pelo homem e somente lhe restasse a opção de preservar poucas flores, aquele belo ramo estaria no topo, aparente, expressivo, estratégica e belamente posicionado, o que o faria significar o ponto mais importante do ser.

Mas, aquela árvore apareceu ali sabe se lá como, sabe se lá quando, saber se lá por que e eu me sinto profundamente desapontada em estar aqui, escrevendo numa folha que um dia fora uma árvore, agora revestida de improfícuos pensamentos, quando, na verdade, nada do prazer que aqui se origina se compara ao encanto de vislumbrar, aqui, bem na minha frente, esta bela, e única, paisagem.

sábado, junho 4


Havia um jardim. Em todo orbe de possibilidades naquele lugar havia um jardim.

quarta-feira, maio 25

No céu, pequena, sem o brilho dos diamantes

Estava tudo muito nublado e a música era melancólica demais para um espírito outrora fugaz e alegre. As pessoas estavam também amarradas demais umas nas outras para um corpo livre. E as coisas estavam confusas. O momento era estranho e o silêncio era mais fúnebre a uma simples pausa musical: da sinfonia 5 de Shostakovich. Foi quando as circunstâncias mudaram e abrira um céu que beirava o abismo da perfeição. Indiferente a toda erudição possível a música a tocar ganharia um reconhecimento efêmero de mais corpo e menos espírito de uma pequena, uma little star.

Foi aí que, sob os raios daquela imensidão celeste e aquela estrela de incomensurável beleza que os seres se retrataram e acordarem: Se você me desculpar, eu te desculpo, por estar a um só corpo e um só espírito milhas e milhas diferente de mim.

quinta-feira, março 31

Eles nos dizem: "Eu que aqui estou, por vós espero"

No sonho, um avião que caiu. Mas o mais incrível e inédito desse fato, dessa circunstância ou desse acidente, como queira denominar, foi que essa queda a todo o momento foi ligeira e macia. Coisa de sonho e de quem anota o sonho. Mas, mesmo que ainda que representasse a assustadora e esmagadora idéia da queda de uma aeronave, imponente, desbravadora, de curiosidade restante para o infinito e além, aqueles que nela estavam não desesperaram. O que eles pensaram era se eles iriam perder o próximo meio de locomoção, o navio, que ficaria distante em alto mar, ressalto, em mais perigo. Mas como um cérebro inconscientemente foi capaz de criar uma situação tão fielmente interpretativa da minha realidade. Mistérios de quando eu quis ser psiconeuroendocrinologista. A questão é que realmente não importa quantas vezes houve uma queda, como contabilizam a maioria das mentes utilitaristas e quantitativas atuais. O importante é que ela seja suave, que você a satisfaça, que você se satisfaça. Aprenda, levante, e saia vivo dela! O José Alencar já havia falado pro Jô: “Perder é fácil. Difícil é saber ganhar. (...) Dentre as difíceis circunstâncias o importante é não desesperar”. Assista e perceba a relatividade da mortalidade. Ele, com tudo isso e aquilo, se tornou um homem imortal de 79 anos de idade. Não se deixe enganar pela quantidade. E eu simplesmente não me importo que alguém bastante desinformado, ou informado em demasia reduza e enquadre essas meras e simplórias palavras em um conceito vazio de “auto-ajuda”. “The eager young minds of tomorrow”, já falava Nash no início de suas aulas, e que, agora sou eu quem digo e pergunto: tem glória maior do que o momento em que você ressurge e renasce de quando a vida não era simplesmente um fato já dado? Essa é contida pelo mais elementar sentimento de viver, não existe outro que substitua o sentido de estar vivo. E nem mesmo é terrorismo, ou "horrorshow" pensar que essa situação é permanente. Afinal, que garantia temos nós? “Se antes de cada ato nosso nós puséssemos a prever todas as conseqüências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar” José Saramago, no único Nobel de Literatura da Língua Portuguesa que indico fortemente e faço coro determinantemente a tentativa de quem lê em fazer refletir. Capiche?

domingo, março 27

Apenas um rascunho


Decidi não maltratar os meus rascunhos,

tão preciosos.

E nem rabiscá-los,

por isso os guardo.


Que tal reaproveitá-los?

Frente e verso.

E não deixar que nenhum espaço branco

ocupe o que é feito do meu coração.


Reaproveitando o reaproveitável.

Sem linhas,

Pontos ou caracteres.


E colecionando,

a caixinha pequena vai ficando cada vez menor.

De belíssimos restos, decompostos em poucas palavras.

Pequena verdade na felicidade dos caracóis


Ontem acordaram com vontade de chorar os caracóis. Sem grandes margens ou perspectivas imaginaram que não valeria os pequenos passos dados com tamanho esforço. Sonhando voar, os caracóis ironicamente se agarraram ao chão, como nunca. Temiam na verdade o poder voar. Eles eram caracóis, afinal. E temiam também o desejo. Então eles pararam, sem vontade de nada, pararam. Foi quando o céu escureceu e as estrelas caíram que mais um dia se passou, assim como as esperanças. E à medida que elas caíam cada vez mais perto ao chão, eles aproximavam-se da arrebatadora imensidão do céu.

quarta-feira, março 9

Regras num descompromisso ao amor

Eu caminhava enquanto relanceei um cena amargadoramente transportável a um tempo desconhecido e não pertencente mim.
Naquela casa, baixa, de grades que me permitiam presenciar da janela a velha mulher a gritar e reclamar ao seu marido a presença ao jantar toda a história começaria. Até então na minha cena só figuravam a casa, o céu e ela. Foi então que ao escutá-la berrando eu descortinei-me ao homem, impaciente na resposta, com o cigarro a segurar e andando sem satisfação nem documento, o que me faria conhecer toda a biografia daquele casal.
Foi mais ou menos assim.
Ele, no bar com os seus amigos quando ela passou. Meio embriagado ao notá-la mudaria toda a sorte de seu destino em pensar em ter aquela formosura ao seu lado, pra sempre. Sonhou com ela dias e dias antes de descobrir quem era para ir ao seu encontro. Ela, imatura no amor, aceitou o pedido de namoro ao homem que não conhecia.
Ele, poucos meses depois, pediu a sua mão.
Então, se casaram, se mudaram, se engravidaram diversas vezes e assim a vida os levou. Ela reclamava do cheiro que ficava na casa após ele acabar com os seus vulgares maços, perdera muitos casamentos pela falta de vontade do marido. E perdera muitas amigas pelo ciúme. Deixou de ser doce com seus filhos e acabou por ser bastante infeliz quando ele chegava a casa com o cheiro de qualquer uma outra, muitas e muitas vezes. Quisera ela não tivesse passado à frente daquele bendito e abominável bar em tempos de carnaval.
E depois de muitos anos, quando muito e pouco já havia se suportado eu passei em frente àquela casa. E ele, carregando o seu vício, anos a fio, fazia com que eu soubesse exatamente o que por eles já havia passado.

segunda-feira, fevereiro 28

Ouros Negros



Era um domingo qualquer quando...
Aliás, não era um domingo qualquer. Dominava aquele aborrecido pessimismo ainda que estivesse tudo belo e que a família estivesse relativamente reunida.
Então, era um domingo qualquer no sentido de que domingo é sempre domingo, mas, além do pessimismo ultimamente reinante seria inédito o ocorrido que se segue.

Estava sozinha na sala, lendo. Ainda que meio desconfortável na poltrona, acostumada com a escrivaninha, a cadeira e tudo milimetricamente calculado, a leitura fluia como se aquelas palavras soassem naturais e não tivessem sido fruto de uma grande pesquisa de um grande pesquisador. Ia-se lá pelas tantas a explusão dos Holandeses e a fixação nas Antilhas – que trariam problemas para a produção brasileira posteriormente. Subsequente a isso vinha a parte em que o autor afirma que o trabalho escravo e o tráfico negreiro é mais rentável à grandes propriedades de terra.
Foi quando ela entrou na sala. Com aquele sorriso inocente por fora, mas, indecifrável pela gente branca por dentro que ela veio caminhando até se sentar na poltrona ao lado. Liberdade dada pelos patrões de que não haveria privações dessa natureza. Bem, eu, curiosa, pedi a ela que lesse, qualquer parte que quisesse da página. No fundo eu queria testar seu grau de leitura mas percebi que ela fluia bem apesar de não entender nada que lia. Perguntei o que ela havia lido de forma embaraçada e com atropelo de palavras. Ela deu uma gargalhada estridente e disse que não sabia, sem o menor peso na consciência ou sentimento de inferioridade, então, como eu imaginava, ela era uma analfabeta funcional.
Eu então numa atitude automática puxei o livro de suas mãos e disse: “Te explico”. Contextualizando a situação de colonização do Brasil eu foquei nas atividades produtivas, não falei de escravidão. Ela não tinha culpa de nada. Talvez eu tivesse. Ou não. O fato é que eu simplesmente recuei nos aspectos morais, detalhava descritivamente o que não omitia. Daí, ela achou muito interessante toda aquela história de associação de Portugal com a Inglaterra e a retomada de reais interesses ao Brasil já que consolidado o grito de independência. Ela gostou de saber que a história de quando saiu de casa se assemelhava um pouco à história do Brasil naquele momento e insistiu, por fim, que eu fosse a Inglaterra e não Portugal. Eu deixei. Simples e um pouco imperfeitas as associações ela pareceu entender e ficamos, as duas, satisfeitas.
Após isso, ela me disse que precisaria sair para “ver se lá fora” precisavam dela. Um tempo depois, terminando o capítulo, eu me levantei e vi que ela assistia televisão, em dia de domingo. Imagine.
Não perderia a oportunidade de perguntar: “E aí, você gosta mais da história que eu te contei ou de assistir televisão.” Imediata e logicamente eu fiquei apreensiva pela resposta. Se ela escolhesse a televisão... Então ela olhou pra mim, riu, fez cara de sabida e disse antes das imensas gargalhadas: “Mais da história, claro, aquele livro, eu achei muito importante!”
Formei uma seguidora latente de Celso Furtado.
Fim.

terça-feira, fevereiro 22

Parecia um ensaio


Eu nunca quisera estar na pele de ninguém como quis ao ver aquela menina com cerca de 11 anos passear na praça com um grupo de amigos da mesma idade. Aquela felicidade, aquele sorriso despreocupado, os cabelos castanhos, pesados e extremamente lisos ao vento de um lado para outro como quem anda sem se preocupar com os passos a qual dar: exatamente como eu era anos atrás, nessa mesma idade. E como hoje não estou. Sorrisos e passos a dar. Foi quando vendo aquela imagem que eu percebi que afinal algo convinha estranhamente. O motivo era entender o porquê de reivindicar o passado e renunciar o presente tão lutado para ser como ele exatamente é. Não há características a mudar, afinal. Foi então que eu entendi que eu não sabia verdadeiramente o que o medo era. Não tinha a menor noção ou idéia. E daí eu percebi que estava, momentaneamente, com medo. Um sentimento que de tão bobo parecia até doentio. Mas passou. Assim como a infância, que não sei mais o que é.
E chorando, como marcas infantis, alguém bastante especial e de timbre sábio me pergunta: "Afinal, qual é o tamanho do mundo que você quer?"
A resposta, eu não precisaria dar.

quarta-feira, fevereiro 16

Intellego

O silêncio da biblioteca contrasta ao silêncio eloqüente da mente. Silêncio despertante de toda atividade ociosa, silêncio estridente, paira-se o corpo a um digno pensar. Um tremendo paradoxo. A cada linha que passam os olhos, vê-se o esvaecer da biblioteca, das pessoas, dos livros. Resta-me somente a mim. Não há tempo, não há movimento, não há mundo exterior, não há o que eles chamam de um universo infinito. O interminável gravita somente neste espaço, entre a tinta e o papel. As mãos levadas à testa, como se fosse possível lhe carregar as idéias, representam um estado interior, de intenso desbravamento. E assim é com os outros. Mas, de repente alguém resiste em continuar. Ao adágio, uma intensa marcha lúgubre. O mundo se volta, e eu, levanto-me da cadeira.

quarta-feira, fevereiro 2

Consequência e Verdade

O que trazia verdadeiramente o coração, naquele momento, era desconhecido. O doer. Foi ainda infantil quando o acordo de cavalheiros foi traçado, numa brincadeira de roda. As conseqüências vinham seguidas das não verdades, desconhecidas. Mais doloroso do que não dizer a verdade é desconhecê-la integralmente. E quando o acordo foi traçado pouco era conhecido. Mas mesmo assim assinado.

Fig: Drew Barrymore em "Para sempre Cinderela (Ever After)", John Faed "Shakespeare e seus Contemporâneos"

domingo, janeiro 30

Quando te atrapalham a escrita

Conversa bastante afinada entre papéis de carta. Séculos atrás que talvez pudessem ser tão mais atuais, não fossem as formalidades das palavras e os belos costumes de civilidade arriados e esquecidos. Dois que não se conheciam, que, nem ao menos conterrâneos eram. Por uma escolha da probabilidade, da sorte, ou do destino – como dizem – aquela carta, vinda de muito longe, escrita tão dolorosamente – às pressas – a contar os novos ares acabou por restar na caixa de correios de quem ainda não entrara na história.
Foi quando a parte que se segue foi lida pela primeira – das muitas outras – vezes em que o interlocutor iria parar-se diante daquelas centenas de palavras ao observar apenas algumas e agarrar-se à carta como quem pede um abraço singelo no físico, mas de tão grande voluptuosidade na alma. “Quem proclama o fim, dá o recomeço. Quem sofre o fim, cala-se”, dizia o texto em questão. Algo, que para o leitor referido, parecia ter sido escrito como se retirado de outro canto, relevante ou não, e simplesmente jogado. Assim, essa parte tornou-se um trecho ao mesmo tempo frio e quente na sua vida. Um trecho desgarrado, um só texto. Inteiramente sem contexto. E depois, de tendo tão vivido, tão sonhado, tão acordado e tão recebido muitas outras cartas do remetente desconhecido a história terminou, sem ao menos ter um dia começado. E daí tudo virou-se como realidade, observada através da ilusão de um espelho.

domingo, janeiro 23

quarta-feira, janeiro 19

A tal da Liberdade


Julga-se que entre o sedentarismo e o nomadismo há um valor mais desenvolvido que outro. Entre todos que conheço tenho notícia de apenas uma família que seja nômade. Não sei se por vontade ou por necessidade, mas sei que são pouco bem vistos. Afinal, falta previsibilidade nas ações, falta confiança na palavra. Às vezes as idéias e os valores acompanham esse estado estacionário e, por mais que alguém tente libertar, a si e a seus pensamentos, eles permaneceriam agarrados a uma base intransponível e transparente. Que mal há em descartar um pouco da própria previsibilidade por um período indeterminado de tempo ainda que ele pouco demore a se findar? Talvez assim seja até mais fácil vencer as intempéries de um modelo a muito vivido e quando se enfrentarão contrariedades jamais habitadas.

Em 140 caracteres: É utilizar da plasticidade da mente humana para encontrar diversas maneiras de nos salvar das contrariedades das nossas próprias atividades.

Isso talvez seja a tal da liberdade. Isso talvez seja fazer si próprio o mundo girar.

E talvez seja isso compreender que se as coisas não foram entendidas, elas mal foram é explicadas.


Fig.: Cezanne, Paul. The Abduction (1867) 89.5 x 115.5 cm; Fitzwilliam Museum, Cambridge, UK

quinta-feira, janeiro 13

Simples, assim.


Diga-me com quem tu andas que te direi quem és.
...
Diga-me quem lês que te conhecerei.
Fig.: Presente de Drika Libanio deste blog